domingo, 13 de novembro de 2016

Inferno



Já acordo sentindo todas as trevas que existem em mim me abraçando. E é tudo escuro, frio, barulhento, enevoado. São todos os meus sentimentos sendo esmagados, ampliados, aumentados, diminuídos, foscos e brilhosos. São todos os meus anjos e demônios lutando bravamente um contra o outro, enquanto minha mente tenta achar o equilíbrio que há muito tempo foi perdido. E são puxões e tapas e gritos e mordidas e arranhões que me dou, que me faço, que me machuco, na tentativa vã de esquecer aquilo que se passa em minha cabeça e transferir toda a dor mental para meu físico. Eu não aguento mais. Peço socorro. Grito por ajuda. Não consigo mais sorrir sem pensar em chorar copiosamente em algum lugar, enquanto meu corpo implora por uma mão divina que vá apaziguar todas aquelas sensações ruins e similares. Eu sou minha própria heroína e minha própria inimiga. Eu posso me salvar, mas estou me afundando. Minha mão é a que me bate, mas é também a que me puxaria desse inferno louco em que me transformei. Não sei quanto tempo aguento estando em cima de uma caixa de pregos afiados que insistem em apontar, rasgar e dilacerar a sola de meus pés. Eu sangro por dentro e tento não deixar o sangue sujar o exterior – não posso deixar pistas da morte lenta que planejo. Não quero morrer. Não posso morrer.
Mas acordar ainda é um pesadelo maior ainda do que apenas ter sonhos ruins.

Iasmyn Gordiano, 14/11/16

Não quero



Eu não quero mais ter que acordar

Às 3 da manha com o coração batendo alucinado


Eu não quero mais ter que acordar

Com as mãos tremendo e o corpo suando


Eu não quero mais ter que acordar

Com a sensação de que uma bola imensa está em minha garganta


Eu não quero mais ter que acordar

Chorando compulsivamente sem nenhum motivo aparente


Eu não quero mais ter que acordar

Sentindo a vontade desesperada de vomitar a minha alma


Eu não quero mais ter que acordar

E ficar rolando pela cama, sem saber o que fazer

Eu não quero mais ter que acordar
Com a boca seca e a mente a mil km por hora 


Eu não quero mais
Ter que acordar.

Iasmyn Gordiano, 13/11/16

quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Despedida?



(essa talvez seja uma carta para alguém que se foi há muito tempo, embora insistisse em permanecer ao meu lado quando o seu amor já não era servido para mim)
Meu cabelo cresceu. Os cachos agora estão mais definidos, bem mais do que da última vez em que nos vimos. Eu emagreci também. Depois de tantas decepções causadas pelas suas mentiras, minha ansiedade atacou de um jeito que me deixou impossibilitada de comer direito durante um mês. Passei a fumar mais – quase três meses em que fumo uma carteira de cigarros por dia. Perdi as contas de quantas noites passei em claro bebendo nos botecos daquela cidadezinha que você dizia adorar. Também já perdi as contas de quantas bocas foram beijadas e quantos corpos passaram por minha cama desde que você se foi. Mudei minhas roupas, embora ainda guarde aqueles vestidinhos que você gostava. Comecei a trabalhar, voltei a praticar meu inglês, conheci novas pessoas. Falando nelas, conheci alguém. Alguém que você já conhecia e que surgiu em minha vida em um momento que ainda não sei se foi muito certo ou errado, mas que tem colocado um sorriso besta em meus lábios toda vez que me chama. Passei a me olhar no espelho e a ver uma mulher – uma mulher e não uma menina. Fico feliz com o que vejo agora, me sinto mais forte, mais completa, mais minha. Admito que alguns dias são mais difíceis que os outros, às vezes a sua falta me arrebata de maneira violenta e me tira o sorriso; são nesses momentos que me forço a esquecer os bons momentos e a lembrar de todas as decepções e tristezas que você me trouxe. Você transformou uma menina colorida e viva em uma versão preta e branca, mas aos poucos vou repintando o quadro da minha vida – e, de certa de forma, te agradeço por isso. Finalmente os pincéis estão em minhas mãos e quem decide as cores sou eu. Não sei como você está, se sente minha falta ou se ainda pensa em mim, embora arrisque que não. Algumas pessoas surgem na vida da outra somente para ensinar alguma lição importante, e, creio eu, somente eu aprendi algo aqui. Pelo o que fiquei sabendo, você ainda comete os mesmos erros – apenas mudou de vítima. Embora ainda ache que a palavra vítima não se encaixe bem nessa situação.
Não sei se essa carta chegará até você. Não sei se algumas das minhas palavras um dia chegarão até suas mãos. Não sei se você ainda guarda as cartas físicas que te escrevi ou se meu casaco do Harry Potter ainda está perdido dentro do seu guarda-roupa excessivamente arrumado. Não sei também se esse será o último texto que te escrevo – provavelmente não. Acho que enquanto esses sentimentos existirem em mim será necessário continuar a escrevê-los – preciso transbordar de alguma forma que não me machuque fisicamente.
Despeço-me de você novamente. Dessa vez, sem um “adeus” ou qualquer outra palavra de efeito. Talvez a gente se esbarre pela vida, pelos bares, pelos shows. Talvez eu te veja com sua nova namorada enquanto dou risada com meus amigos em algum show de Scambo. Talvez a gente se bata enquanto faço compras com minhas tias. Talvez um dia eu passe por você e não te reconheça e, ai sim, saberei que meu coração processou a informação que minha mente insiste em gritar para ele todos os dias: que não vale a pena ter você em minhas memórias.
Te vejo por aí.

Iasmyn Gordiano, 11/11/16

Crescimento



Nós somos como água e óleo.

Nós fomos como água e óleo.

E nossos mundos colidiram por algum erro do Universo. Talvez eu tenha precisado de sua presença para crescer como ser humano. O Mundo talvez tivesse planos para mim que, em minha inocência, eu achasse desnecessários. Mas não foram. Vejo que não cresci contigo – ao contrário do que achava. Eu estagnei. Mudei sim, mas não por mim. Mudei por você, pra me encaixar em seus ideais de par perfeito. E, veja só, tamanha foi a minha surpresa ao perceber que não existe par perfeito – pelo menos não pra você. Depois que fui embora (sim, quando eu percebi que era hora de ir e procurar um outro lugar) notei que o mundo mudou. Mas dessa vez, ele mudou por mim. Porque eu mudei. A mulher que me tornei talvez seja mais arredia e desconfiada, porém é infinitamente mais forte do que aquela menina que você conheceu. Eu ainda gosto de política e de estudar sobre assuntos que nunca foram do seu interesse. Ainda tenho o mesmo gosto musical, as mesmas piadas sem graça, a mesma mania irritante de ver o lado positivo das coisas. Mas me tornei muito mais eu mesma e menos você, e essa com certeza é a parte que mais me deixa feliz. Hoje vejo no espelho uma mulher, não uma menina. E sendo uma mulher, noto que você não era homem – apesar da barba, das tatuagens e das conversas aparentemente maduras. Você é um menino. E quando digo isso não é apenas falando sobre a parte biológica da coisa; você nunca teve atitudes de homem, não quando só fazia mentir, enganar e manipular.

Hoje eu sou uma mulher. Poderia te agradecer por isso, mas na verdade o mérito é todo meu.

Hoje eu sou minha. Hoje sou só eu.
 
Iasmyn Gordiano, 10/11/16